domingo, 17 de dezembro de 2017

Noite curta

Noite curta

Quando a noite não for o suficiente para me engolir,
eu engolirei a madrugada
com gosto de tequila e sal,
e de fumaça de cigarro e incenso,
e sarro escondido no banheiro úmido de prazer.

Quando a noite for curta demais,
eu atropelarei as placas que dizem proibido estacionar,
e todas as demais que queiram me proibir,
seja do que quer que for,
porque a ordem da vez é seguir meu coração,
esse doido varrido,
que me aponta para cumes que eu temo escalar.

Quando a noite já não mais for,
eu ainda serei,
torta, densa, descompensada,
rasgada de desejo e de sussurros habitada.

16/12/16
Lilly Araújo
00:30h

domingo, 10 de dezembro de 2017

Sobre Esperança na Fenestra do Ocaso


Te beijo com os lábios de uma Poeta perdida em um pôr-do-sol que não vigorou. Margeio  oceanos salgados, aos quais acrescento mais sal: os das minhas ininterruptas lágrimas de um ocaso mal sucedido.
Vagueio, como um barco à deriva, numa noite sem luar para servir de luminária dos apaixonados. Não há sequer estrelas nesse limbo onde minha alma foi condenada a perambular, enquanto canta com a boca murcha sons de um coração despedaçado, desajeitado, e bêbado de solidões.
Ainda sonho com o Paraíso, apesar de tudo, é como se a luz da esperança tentasse romper uma pequena fenestra, e por fim, oferecer-me algum alívio. Nessas poucas vezes, eu posso jurar ouvir teu pintassilgo cantar poesias para mim, então eu me acalmo e adormeço...
Acordo mil anos depois. Ainda limbo. Ainda nevoeiro. Ainda saudades. E na fome de mais uma gota de absinto, que possa haver nas palavras do Poeta, que também é Profeta, eu me obrigo a retornar ao caminho da procura. Sempre à procura. Uma busca sem fim!
Te beijo, com vontade de coisa alguma, apenas de me encontrar um dia.
Ass.: MARIA
{Lilly Araújo-  09/12/17}

domingo, 26 de novembro de 2017

CARNEIRINHOS PARA MINHA INSÔNIA

CARNEIRINHOS PARA MINHA INSÔNIA

Chove ruidosamente.
A chuva disfarça as lágrimas
que eu não deixo mais cair.
Nos braços da noite
de mais um sábado abandonado,
vou contando carneirinhos
para minha insônia dormir.

Chove denso,
com tom fúnebre de trovões
orquestrando letras ocas
para gravarem meu epitáfio
em pedra mármore enregelada.

Morre-me
na presença do agora,
mais outra vez adiada,
a esperança de quem sabe um dia.

A chuva chegou tarde.
Outra vez, tarde demais!
A vida era um faz-de-conta
que alguém escreveu por engano,
num momento úmido de melancolia.

Lilly Araújo

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Melancolia

Não sei se sei cuidar da minha alma. Único bem que tenho que é transcendental a essa vida efêmera.
TEMPUS FUGIT. CARPE DIEM!
E mesmo com todos os alertas na língua erudita, eu não posso obedecer.
Afogo minha alma em melancolia, irrigo suas veias em todo meu estado líquido e denso, intermitente e confuso. Quando não o faço,  não sou mais eu e não me reconheço. Perturbo aos que suportam minha presença com meu mutante humor; ora riso, ora pranto, ora extravagância, ora mudo/surdo/daltônico.
Volto a escrever inutilmente apenas para não ter que verbalizar minha dores banais. Poupo os ouvidos daqueles que não precisam me ouvir, ao mesmo tempo que poluo as vistas daqueles que ousam ler esse amontoado de coisa alguma.
Quero um bosque só pra mim, e mergulhar todos os dias no Walden. Invejo Thoreau! Sou covarde demais para largar tudo (o que nem tenho) e me entregar para o que realmente necessito.
Como eu disse: - Não sei cuidar da minha alma! - E sigo mergulhando-a em melancolia, enquanto sonho arco-íris desbotados na minha retina que descolou-se no último golpe do destino.

Lilly Araújo - 24/11/17
10:10h

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Reflexos de uma tosse

Tossia intermitentemente no decorrer da semana, ao cair do sexto dia pensava em morrer, aliás, em não morrer. Depois de tantos anos flertando descaradamente com a morte, e  tantas vezes apelando para seu gélido beijo, agora se pegava surpresa ao pensar que não a queria mais. A paixão havia passado. Concomitantemente fora substituída pelo almejar de um outro beijo, desta vez quente, mas igualmente fatal, meteórico e definitivo.
Pensava em morrer em meio aquele silêncio intercalado pela tosse seca, pensava em não morrer, aliás. Ainda não. 
Ainda não!

Lilly Araújo – 15/10/17
21:20h

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Amor Virtual



 
AMOR VIRTUAL

Olho o Quintana caído sob a lateral de minha cama,
dois ‘quase-estranhos’ dentro do mesmo cômodo íntimo,
e na minha intimidade aquele ‘não-mais-estranho’,
longe do quarto e dentro das minhas entranhas.

Lilly Araújo- 20/09/17
09:04h

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Anatomia de um buraco negro


 
Anatomia de um buraco negro

O golpe foi certeiro
entre a décima terceira vértebra
e sua condição inexistente.

Agora era gêmea idêntica
do absurdo,
e irmã do infinito que se esconde
após a curva da última estrela-cadente.

Quando o Coelho Branco de Alice
lhe fez sinal, não o seguiu,
antes, o convidou a voar consigo,
pois seu mundo era ainda mais belo que o dele,
e lá ninguém cortava cabeças e nem asas.

Quando o ponteiro do relógio badalou as 13 vezes,
descobriu que ali o tempo era infinito...

Lilly Araújo
05/09/2017
22:31 h

domingo, 3 de setembro de 2017

A Proposta

 


A proposta

Eu topo!
Quando você existir, e insistir,
e persistir, e introjetar-se em mim.

Eu topo!
Quando você se diluir, assim,
quase sem conseguir continuar dono de si.

Eu topo!
Quando você topar se desconstruir,
e, Quimera, nos tornamos um,
para colher o porvir...


Lilly Araújo
2/09/2017 22:07
 

sábado, 19 de agosto de 2017

Insistência

 
Insistência

Tomo meu café.
É fim de tarde.
Sempre meu café
e a minha saudade.

É sempre o café
e o seu doce-amargo,
e na alma a amargura
de estar viva, de estar só,
de estar sem ti...

O café e a insistência
em existir.

Lilly Araújo- 19/08/17

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

A Doida

A Doida

A Noite passa, noivando.
Caem ondas de luar.
Lá passa a doida cantando
Num suspiro doce e brando
Que mais parece chorar!

Dizem que foi pela morte
D’alguém, que muito lhe quis,
Que endoideceu. Triste sorte!
Que dor tão triste e tão forte!
Como um doido é infeliz!

Desde que ela endoideceu,
(Que triste vida, que mágoa!)
Pobrezinha, olhando o céu,
Chama o noivo que morreu
Com os olhos rasos d’água!

E a noite passa, noivando.
Passa noivando o luar:
“Num suspiro doce e brando,
Pobre doida vai cantando
Que esse teu canto, é chorar!”

- Florbela Espanca-

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Proposta indecente


Esses dias estava passando “Jurassic Park”, e me lembrei de uma ‘máxima’ que ouvi no filme e me marcou: — A vida sempre encontra um jeito! — disse um dos cientistas, em contraponto a que o fundador do parque afirma em estar no controle por ter ‘produzido’ apenas dinossauros de um dos sexos (fêmeas, se não me falha a memória), para evitar assim que se proliferassem indiscriminadamente.

Hoje, essa frase verdadeiramente me irrita, porque eu penso que na morte temos um ponto intransponível de dúvidas eternas, uma barreira que se interpõe sem que tenhamos qualquer escolha entre ir ou ficar, é um rasgo abismal entre os que morrem e os que vivem, e que nunca é recebido de bom grado. E há sempre a dor, e a inconformação e o luto. Nós, o que ficamos, passamos de lágrimas a porquês, sem aviso prévio e nem respostas que amenizem o sofrer.

O que mais tem me indignado no presente momento, é pensar que, passado algum tempo, quando a ferida ainda está viva, e enquanto ainda posso chorar e me entristecer sem ser censurada, a vida vai exigir que eu continue, que eu retome meus afazeres, que eu encontre novos motivos para sorrir, e para querer viver.

“A vida encontra um jeito” (de continuar) para nós, os enlutados. 

Estou achando terrível que eu volte a sorrir depois de planos em parceria que foram rasgados abruptamente, sem uma gota de piedade. Acho injusto que eu volte a sonhar e fazer outros planos. 

— Pensar em um ‘outro alguém' no lugar dele? — acho uma proposta indecente!

Lilly Araújo - 08/08/17

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Dura certeza



Dura certeza

Choro mais que as lágrimas conseguem brotar,
e mais que as hastes possam sustentar
a desestrutura do agora.

— Por que choras pobre menina?
Pergunta a voz do que não ouve.

Choro a perda irreparável
do cantor sem sua voz;
do pintor sem os dedos;
do louco que se curou,
e não sabe continuar...

Choro os dedos extirpados das fiandeiras,
e o pintor que não tem mais os seus pincéis,
o choro da bailarina sem seus pés.

Eu choro, porque agora,
eu sou eu sem eu mesma,
nessa dura certeza
que você jamais!


Lilly Araújo - 07/08/17







sábado, 29 de julho de 2017

Solidão ou minha biografia cabe num simples haicai

Solidão, esse escafandro de aço que visto. Esse profundo mar de pequenas coisas insignificantes. Pequeno quarto de descomunais significados. Conheço de cor o costume dos pescadores noturnos, as pragas dos mochos, o ensaio do choro afinado das carpideiras, a maldição da licantropia. Eu também sou meio bicho, meio lobo. Eu também enlouqueço nas noites de lua. Todos os homens têm uma grande história para contar. Uma biografia rica de detalhes. As tristezas e angústias dos outros dariam um grande filme... Toda a minha vida cabe num simples haicai japonês, um artesão das palavras talvez conseguisse construir um soneto com os fragmentos pobres dos acontecimentos da minha vida. Mas tenho certeza que de um soneto não passaria. Sou apenas um solitário que conhece as constelações, o mapa das marés e os horários dos trens. Ser solitário significa conhecer bem as montanhas, os rios, a poesia. A leitura é o ópio de um homem solitário. A solidão nos brinda com certos poderes que beiram o sobrenatural. A metafisica é um portal para o conhecimento interior. Apenas um baixo muro separa o conhecimento interior de um quarto branco de um manicômio. A solidão é assaz proveitosa para quem tem uma alma desbravadora das coisas incorpóreas. O mundo como vemos da janela soa pobre para quem procura pistas obscuras em dimensões que parecem estranhas aos homens comuns.

Solidão, essa cabana furada, essa busca pelo tudo, essa luta por nada, essa confusão de algoritmos, esses signos sem significados aparentes. Esses tantos caminhos. Conheço de perto as estações. A boca vulcânica do verão, o desalinho do outono, a insensatez do inverno, a promiscuidade da primavera... As lutas das virgens, os conflitos das mulheres, o sentimento dos homens. O ser humano tem ojeriza da solidão. A solidão tem cara de morte, amiúde. A solidão é um bicho, uma doença maligna, um nevoeiro infernal, assim pensam.  Não conhecem a solidão, de fato. Essa entidade silenciosa, musical, aberta as cores, aos mundos, as resoluções. A solidão é a mãe das artes, das atitudes, dos fenômenos mágicos que transformam as almas. A solidão é a única embarcação capaz de tirar o homem da ilha do si mesmo. É a solidão que me faz enxergar minha pouca história, meu pouco de mim. Sem ela, eu talvez acreditasse que eu caberia num imenso livro cheio de bobagens, mas a solidão me ensinou que nada sou, e caibo em qualquer haicai de guerra ou de paz, aí depende da visão do autor.

Radyr Gonçalves

TREZE

 

TREZE

Tenho te ligado a todo instante,
uma média de treze vezes por minuto,
para cada um dos três números teu que tenho,
e todos estão mudos e surdos.

Faz treze dias que não te vejo,
e que tu não me vês, ou me cheiras,
ou me ouves, ou me sentes, ou enxergas,
ou me ressuscitas...

Aqui jaz, nessa sepultura do silêncio,
há treze dias, minha tatuagem desbotada
dos meus treze pássaros,
minha pele escurecida, minha própria vida.

Ainda ressoa a tua mentira no ar:
— Eu vou aí, hein!
Como costumavas me ameaçar...

E na contagem estática do meu mundo inerte,
amanhã também será treze dias,
esse número que me persegue,
que me enlouquece,
e me possui por inteira.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Amanhã, quem sabe tu?

Lilly Araújo - 29/07/17

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Fragmentada


Fragmentada

O relógio quer que eu acompanhe seus ponteiros,
os teclados insistem para que eu os acaricie,
a música murmura segredos que não quero entender,
eu só quero deitar e esquecer.

Todos querem um pedaço de mim!
O cão abanando o rabo;
o pés da mãe que pedem massagem, exaustos;
o agente de saúde que finge fiscalizar se há água parada
para combater do mosquito da dengue,
mas que no fundo, assim como eu,
quer apenas agitar suas próprias águas paradas:
— As da alma!

Todos querem um pedaço de mim!
E eu já estou tão nada,
que não me sobra causa alguma para lutar.
Transformo-me em riso branqueado à força,
só para sorrir para o público da vez.

Não sei qual parte de mim está mais insossa,
porque eu-aos-pedaços
não caibo em nenhum espaço,
em nenhum abraço...

E todos continuam a exigir de mim.
Quisera eu evaporar no espaço,
e negar a todos o que todos me negam:
— dar-me de si mesmos um pedaço!

Lilly Araújo – 26/07/17
20:50h

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Distopia



 
Distopia

Eu conheço os passos da dança,
mas piso no teu pé de propósito.
Eu conheço as regras do jogo,
mas adoro a infração a que me proponho
todas as manhãs.

Eu reconheço o seu xeque-mate,
mas viro o tabuleiro,
confundo todas as peças,
e ferro com tua cabeça,
só para sorrir à noite.

Eu conheço todas as lágrimas,
mas as escondo num vidro
com tampa fechada à vácuo,
e o pote só se quebra nas madrugadas,
onde eu não reconheço mais nada.

Lilly Araújo - 17/07/17

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