Uma poeta de vigor. Porque consegue um diálogo extremo com a sua
solidão. Permite-se invadir pelo frio tenso da alma quando as paredes
desabam, e permanece apenas ela, a mulher escritora, e a proteção da
poesia. Como ela diz, “considera-se poeta não por vontade, mas por
obrigação de ser o que é”.
Acredito que o
poeta não se sabe definir. Pelo menos eu não sei. Pelas minhas lembranças, eu
já nasci assim, com um som atormentando meu peito desde muito nova. Eu sempre me preocupei com questões que eram alheias
às demais crianças e sempre fui excessivamente sensível.
Sofria com
ansiedades crônicas dignas de adultos, com direito a febres emocionais e uma
cobrança exacerbada de todos meus atos e produções, auto imposta. Sempre levei
a vida muito a sério. A sério demais para meu gosto. Acho que envelheci cedo.
Por outro lado
também vivia muito compenetrada nas mínimas sutilezas e delicadezas do meio
ambiente, coisas que os adultos se esquecem rapidamente, assim que deixam de
ser crianças.
Amo tudo! Coelhos,
cães, gatos, morcegos, aranhas, cobras, borboletas (mesmo em fase de lagartas),
lagartixas, plantas, rios... amo particularmente água, com uma conexão
inexplicável e terna.
Então, eu penso
que nasci poeta, bióloga e criança-adulta; e hoje sou uma adulta-criança-velha.
Porque essas sutilezas, que só os pequenos sabem enxergar ainda estão
impregnadas em mim como se quase nada tivesse se desgastado durante o passar
dos anos. E ao mesmo tempo tenho uma alma velha. — O poeta já nasce com a alma antiga
—, não é isso que dizem?
Sou uma antítese e
também uma metamorfose ambulante. Acho que a biologia me definiria como um
‘híbrido’. Mas sei que não sou o único ser assim, creio que é coisa da
‘espécie’, somos assim mesmo, nós os poetas.
Deve ser desse
barulho todo aí que vem o Som Do Coração.
A sua poesia parece-me uma represa. A
represar vida e morte. E, ao mesmo tempo, um átomo de desespero solto. Que
emoção é esta? A represa, fechada e em ebulição, e o átomo, são convergentes em
sua poesia?
Tudo isso que você falou luta dentro de mim,
Fernando. Sinto que você definiu melhor que eu poderia.
Represa, átomo, tsunami, maresias, pousar de asas
de borboletas, cheiro de terra molhada de orvalho e café fumegante... Barulho
de chuva, canção de estrelas, perfume de couve esmagada nos dentes da minha
criação de coelhos...
Tudo me toca. Tudo me dói. Tudo me alegra e me faz
querer chorar.
Tem um caos no meu interior. Longe de querer me
comparar ao grande Fernando Pessoa, mas me pego sendo várias ‘eus’ o tempo
todo. Não sei se isso é bom ou ruim, ou se é necessário classificar. Nós
humanos, principalmente os biólogos, temos mania de querer classificar tudo,
catalogar sistematicamente e dividir a vida em ‘caixinhas’. Bom, eu não acho
que eu me encaixe em nenhuma dessas. Apenas sou isto.
É de sentir que as emoções, como
trigo, fermentam os seus dias. Como realiza a sua poesia, profundamente
carregada de cismas e dúvidas? É próprio do poeta viver em dúvida?
Minhas poesias são totalmente carregadas de cismas
e dúvidas. É meu momento de visitar o confessionário. Desabo sobre elas os
segredos que nem mesmo eu sei, aqueles guardados no subconsciente e até mesmo
no mais profundo do inconsciente. As ideias e as figuras mais descabidas vão
jorrando como um rio, e eu vou digitando até que estanque a sangria da minha
alma. Assim, de bate e pronto elas nascem.
Ao mesmo tempo em que prestam o papel de diário
pessoal, não são autobiográficas; às vezes até são; às vezes, falam de mim
misturado a outras ‘gentes’; e às vezes, só falam de minhas impressões do mundo
ao meu redor.
Escrevo desde os meus quatorze anos, e
sempre foi assim. Nunca estudei as métricas e regras de construções de poemas,
ou li os poemas de outrem, exceto os de J. G. de Araújo Jorge, que encontrei
meio que por acaso numa biblioteca um dia, e que me intrigou muito pelo seu
jeito, digamos que, mais ‘popular’, de escrever. Mesmo assim, ele é um poeta cujas
obras são difíceis de achar, e só muito mais tarde encontrei alguns de seus
livros em grandes sebos. Ademais, passei a vida toda fugindo de ler poesias com
medo de me ‘contaminar’; por exemplo, a bem pouco tempo escrevi os seguinte
versos: Faço amor com as palavras/ Gozo
com a alma/O corpo me denuncia. Para poucos dias depois encontrar a
seguinte frase, ao ler Rubem Alves: “Ler
é fazer amor com as palavras”.
Senti aliviada ao saber que, seja qual
for a repetição, eu não o estava plagiando, e isso me basta. Acredito que seja
mais uma dessas energias sutis do inconsciente coletivo. Mas de qualquer forma,
de um tempinho para cá, com medos ou não, venho sentindo que esse ciclo de
isolamento chegou ao seu fim, estou agora no caminho oposto, lendo todos os poetas
e escritores, principalmente os nacionais, e pesquisando tudo que posso.
Ainda escrevo como quem sangra no papel, e não dá
para ficar contando versos e catando rimas nessas horas. Talvez eu mude de
estilo no futuro, talvez não.
Você é bióloga por formação. Tem
outro poeta, desatinado, biólogo por natureza. Manoel de Barros era dos bichos
e plantas. Você, amiúde, está cercada de animais e os acarinha. O que este
contato íntimo com a criação e as criaturas colocam dentro de sua literatura?
Não conheço quase
nada de Manoel de Barros e dos demais poetas, como eu disse anteriormente, ainda
estou engatinhando no empenho de conhecê-los.
A natureza é tudo
para mim e eu sinto que estou em falta com ela, pois apesar de fazer parte de
um belo projeto em minha cidade intitulado “SOS TERRA-Arte em prol da Ecologia”,
onde levamos música, teatro e poesia, e palestra ecológica para escolas; eu
quase não tenho nenhum poema escrito especificamente para este; nem para a
idade do público alvo, que é ensino fundamental; muito menos de cunho
ecológico. Como bióloga isso é meio vergonhoso, mas é eu só escrevo o que me
pulsa, e não sobre encomenda.
Ainda pretendo
escrever sobre meio ambiente. Na verdade, tenho duas poesias infantis que estão
inéditas ainda, essas sim, são sobre plantas e bichos, num ambiente bem lúdico.
Pretendo que sejam, em um futuro próximo, dois livros ilustrados.
Particularmente achei-as bem gostosinhas para a garotada. Fiz as duas no mesmo
dia, de uma tacada só, como o costume do meu processo de criação, e depois
nunca mais me veio inspirações semelhantes;
O seu olhar sobre o mundo mostra
alguma crueldade com você mesma? Acha que o sentido humano vai melhorar? Ou a
violência vai exterminar o nosso espírito vital?
Você, Fernando Coelho, é um poeta que tem me
influenciado bastante por causa do seu mote que é o amor, e é também o meu.
Para mim tudo gira em torno do amor e suas diversas faces.
Mas infelizmente, o que se percebe, é que eu e você
fazemos parte da exceção, e do pequeno grupo dos que não acham que o amor é
piegas, ou coisa démodé. E a meu ver o mundo caminha rapidamente para a
desumanização, convergindo para uma frieza e egocentrismo muito acentuado.
Vejo com tristeza, que o futuro não é um mundo onde
eu gostaria de morar, pelo contrário, me identifico muito mais com o jeito de
viver de séculos passados, talvez no período do Romantismo, ou mesmo do
Ultrarromantismo, que explicitam o meu jeito de sentir.
De igual forma, o desgaste e desrespeito ultrajante
ao nosso Meio Ambiente também me mostra que o futuro não será um lugar mais
bonito do que o ontem. Apesar de não querer ser uma pessoa pessimista, e não o
sou, esses são fatos previsíveis, ou mesmo visíveis.
O amor é fundamental? O amor é
sofrimento? O amor é tudo? Em sua alma e em seu cotidiano, como convive com o
amor?
O amor é, sem
dúvida, fundamental! Tire-me ele e não sobrarei.
O
sofrimento e o amor também são duas coisas que não consigo ver dissociados.
Quem ama sofre, quem tenta não amar sofre o pior dos males, em minha opinião. O
ser humano foi criado em amor e para amar. O amor salva e cura.
O
amor é tudo!
Canto
sobre o amor desde sempre; na minha criancice; na minha pieguice; em minhas
ridicularidades; eu não me importo mais de ser ridícula. E eu o exalto consciente
de que sobre ele nada sei. Esse sentimento é amplo demais, para que uma
simples mortal como eu pense saber defini-lo ou vivê-lo em sua totalidade.
O
que eu faço é ir tateando em busca dele, implorando por encontrá-lo em uma
curva dessas da vida; sonhando em vislumbrar uma partícula que seja da luz que
só ele pode fornecer.
Lilly Araújo é bióloga por
formação acadêmica, mas escreve poemas desde os quatorze anos como expressão
de sua alma. Só adentrou no círculo literário a partir do ano de 2011, tendo de
lá para cá participado de algumas antologias e classificando-se em alguns
concursos, nas modalidades poesia, contos e crônicas.
Considera-se poeta não por
vontade, mas por obrigação de ser o que é.
Em 2014 foi agraciada com o
título de “Imortal”, empossando a cadeira n. 27, da Academia de Letras do
Brasil-seccional Anápolis.
Em 2015 inscreveu-se na ULA
(União Literária de Anápolis).
Em 29 de Junho de 2016 lançou
seu primeiro livro de poema intitulado Som Do Coração.
•Venda virtual pelos contatos:
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