segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Primeira vez na tua língua


Primeira vez na tua língua

O mar me lambeu hoje
com a intrepidez daquele que sabe o que quer,
e o discernimento de oferecer
o que mais deseja uma mulher.

Lambeu-me entre as pernas,
num súbito atrevimento desejado,
mas não antes de olhos nos olhos
e um beijo profundo,
e promessas de um hoje terno e absurdo.

O mar lambeu-me entre as pernas,
e eu gozei ostras sem pérolas,
porque agora não havia sofrimento.
Não nesse exato momento.

Lilly Araújo
Arroio do Silva- 04-11-16


quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Sou filha da mãe



 
Sou filha da mãe


Sou filha da mãe.
Filha da puta,
que puxa a carroça encarcada pra um lado
por levar todas as cargas,
e enfrentar vários sois ainda por vir,
e que se esconde no céu em cada lua nova
para chorar baixinho enquanto finge sorrir.

Eu sou filha da mãe!
Filha da luta!
Que limpa com uma mão o resto de parto,
e com a outra, mexe a massa do salgado,
pra não deixar morrer de fome
nenhum dos vermizinhos que pariu.

Eu sou filha da mãe gentil,
que com a cinta na mão, tantas vezes,
me deu o brio na cara que muitos não têm,
que me deixou cicatrizes profundas na alma,
mas que hoje, entendo muito bem.

Eu sou filha dessa mãe,
que não sabe escrever poesia,
a não ser com suas mãos calejadas,
e sua coluna entortada
pra ganhar o pão nosso de cada dia

Eu sou filha dessa deusa,
dos cenários de suores e labuta,
que de puta, santa, recatada e do lar,
é tudo que desejo me tornar.

Lilly Araújo - 30/09/16
(09:40h)

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Adjetividades inúteis



 
Adjetividades inúteis


Dispenso comentários sobre mim
— Linda, inteligente, educada!—
foda-se você e seus adjetivos vazios
e mais broxantes que sexo com DST.
Eu não preciso me medir a partir de você!

Eu não sou nada, não quero ser nada,
e a partir da convicção que tenho de mim
em relação ao universo sem finitudes,
passei a limpo milhares e milhares de minhas atitudes.

Foda-se tantas coisas!
Rasguei as velhas cartilhas.
Não quero, e não vou nunca mais,
ser “bela, recatada e do lar”.
Vou ser o que quiser a cada dia,
e todo dia vou mudar de ideia se eu gostar.

Não há mais ilusões dentro de mim,
pois degustei cada uma como aperitivo
de um copo de cerveja gelada.

A minha verdade nua,
tão nua como desejo estar,
baila livre com suas pregas, peles,
dermes e epidermes,
suores e líquidos hormonais.
Não sou o que fui, e esta,
partiu pra nunca mais!

Fiquei cética, fria; cínica talvez,
mas entendi por fim,
que a vida é um tabuleiro de xadrez.

Pra você que me olha,
e tenta me domar, cuidado
para que o seu coraçãozinho não enfarte,
porque minha próxima jogada
é xeque-mate.

Lilly Araújo- 04/10/16
12:36h

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Décimo segundo andar

 
Décimo segundo andar

No vão entre a saudade e o décimo segundo andar,
eu me despenco em busca de algo que nunca saberei,
e me destroço no percurso da queda,
desfazendo-me em mil pedaços de carnes
apodrecidas  por cada dor sentida.

No vão que me convida todo dia,
com som de flauta doce a encantar-me os ouvidos,
com o tom hipnótico como de lábios de sereias,
eu me deixo levar e salto sem vontades de ficar.

E no caminho da queda,
a ventania me lambe por inteira,
e gozo em espasmos que nunca senti...
É o prazer que busquei por toda existência!

No átimo entre a queda e o paraíso,
eu desperto outra vez,
e desse sonho resta-me apenas isso:
— saudades do além, do que não é,
do que não sei que quero, mas quero!

Resta-me também a doçura de odores
liquefeitos no ar, desse prazer inominável
que é deixar-se seduzir
pelo vão do décimo segundo andar
e apenas saltar.

Lilly Araújo- 29/09/16
09:14h

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Das vezes de esperar



 
Das vezes de esperar

Vinte velas acesas para iluminar o meu sonho,
vinte vezes eu olho na tela do celular buscando em vão,
na aridez da descompostura da minha cervical
que me entorta todas as juras que nunca cumpro a mim mesma.

Pela vigésima vez, só esse ano, eu me embriago
de absinto e mel, como se o paladar
de qualquer um deles fossem-me a mesma coisa.

Vinte vezes eu olhei o horizonte na esperança de ver você chegar,
entre as brumas mal dormidas e sorrisos amarelados
desfeitos no brilhar de uma aurora boreal.

Vinte vezes ou um pouco mais,
e nunca, nunca em qualquer uma delas,
meu peito teve um instante sequer de paz.

Lilly Araújo - 27/09/2016
08:59h
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